Uma mão lava a outra
Nas terras do Noroeste era hábito os grandes senhores latifundiários terem amantes. E amantes significavam encargos extra: todas tinham a sua casa e os seus empregados.
Como a confiança neste tipo de relação era mínima, os senhores contratavam sempre um homem para lhes vigiarem as amantes e para travá-las no intuito de cometerem traições. Esse empregado era conhecido na gíria como «mamão», porque não fazia grande coisa e ainda “mamava” um belo salário. Era assim normal dizer que «o mamão trava a outra». Daí derivou para o nosso conhecido ditado.
Cão que ladra não morde
António Joaquim era conhecido por todos como “O Trocas”. A explicação era fácil: o Tó trocava-se e trocava tudo. Colocava as cuecas no congelador e as costeletas no tanque; gritava «golo» quando o seu Benfica sofria um remate certeiro; parava com a sua Casal Boss no semáforo quando estava verde e arrancava quando estava vermelho, e por aí fora.
Mas “O Trocas” não se trocava só nas acções, e fazia o mesmo a escrever e a falar. Na escrita utilizava frases como “Excelentíssimos senhoras”, “uma dia” e “um vassoura”. Já a falar, da sua boca ouviam-se pérolas como «até amanhã se a Deus quiser», «se amanhã não chover faz uma linda dia», «o que está feito, feita está», e, a sua frase preferida, «cão calada não morde porque está de boca fechada».
Esta última frase pegou e entrou nos ouvidos de todos os que rodeavam “O Trocas”, e que por sua vez gozavam com ele gritando-lhe «cão calada não morde». Daqui evoluiu até que chegou aos nossos dias como o conhecido ditado.
Quem não tem cão, caça com gato
Joaquim Almeida não era um homem feio. Não cheirava mal, não se vestia de forma desconcertante, fazia a barba todos os dias e o seu cabelo era sempre cortado na perfeição. No entanto, do seu tom de pele e do local de nascimento não podia fugir. Não que se envergonhasse da sua cor um pouco mais escura que o normal e de ter nascido no Congo, país onde os seus pais trabalhavam aquando da sua vinda ao mundo. Se ele não se envergonhava disso, o pior era mesmo a alcunha que tinha pela aldeia, e para a qual muito contribuíam os dois factores anteriores e o facto de, devido a uma má nutrição na sua infância, ser um pouco mais baixo que o normal. Joaquim Almeida era conhecido como o “Conguito”.
Na aldeia a vida corria sempre pelo melhor, até que um dia tudo mudou, ou melhor, mudaram os hábitos alimentares que, por sua vezes, alteraram a vivência normal.
O senhor Li Xi Xi, nascido e criado em Xangai, emigrou bastante cedo para Portugal. No entanto, essa viagem custou-lhe os olhos da cara, mais propriamente o olho direito, arrancado pela Máfia Chinesa por incumprimento das obrigações (€) para com eles. Fugindo a esse perigo, o senhor Li Xi Xi viajou pelo interior do país, tendo ido parar à aldeia do nosso Conguito.
Chegado à aldeia, onde foi bastante bem recebido, o senhor Xi Xi resolveu a certa altura organizar jantares para todos os habitantes, influência do seu primeiro emprego como cozinheiro num restaurante chinês. E o prato que mais aceitação tinha por parte dos aldeães era o cão no forno com soja. Todos os habitantes adoraram o prato. Depois de alguma renitência para com o facto de estarem a comer cão, lá perderam os preconceitos e foram pedir a receita ao senhor Xi Xi.
O resultado foi o que se esperava: todos os cães foram comidos com prazer. Todos, com excepção de alguns…
Forçados a arranjar outras formas de alimentação, os aldeães viraram-se para a caça à raposa que, diziam, tinha um sabor maravilhosamente idêntico ao do cão.
O Conguito, por seu lado, não concebia a ideia de se alimentar com canídeos. Além disso, a fome que tinha passado na infância tornava-o resistente aos prazeres da gula. O Bóbi, o Jóli, o Sinupi, o Pantufa e o Quinzinho, os cães sobreviventes, eram assim cobiçados por todos os aldeões que, a caminho da floresta para caçar, paravam na casa do Conguito a babar por aqueles repastos canídeos que ali estavam tão perto e, no entanto, tão longe do prato.
Cada vez que um aldeão, de caçadeira ao ombro, parava em frente à casa, o Conguito saia prontamente para meter conversa e, por outro lado, para evitar males maiores. A meio da conversa surgia sempre o mesmo lamento por parte do caçador: «ai pá, quem não tem cão caça, Conguito». Daí o nome de “Conguito” foi derivando para “com gato” e chegou aos nossos dias como o ditado que todos conhecemos.
A galinha da vizinha é melhor do que a minha
Joaquina Madureira era uma mulher de sangue quente e pêlo na venta. Mas, ao que parece, isso não era suficiente para o seu marido, que a enganava constantemente com as mulheres da aldeia.
Como as verdades vêm ao de cima, Joaquina acabava sempre por descobrir as infidelidades do marido. E isso resultava em acesas discussões que eram acompanhadas, qual relato futebolístico, por todos os vizinhos. Estes chegavam até a convidar os familiares para assistir a mais um desafio “Joaquina vs. Marido”.
Entre os muitos impropérios largados a altos berros nessas discussões, e entre o meio de muitos «porquê» soltos em jeito de intimidante interrogação, a frase que mais vezes se ouvia da boca de Joaquina era «a da vaca da vizinha é melhor do que a minha, é?». Com o passar dos tempos, tal frase tornou-se uma piada popular mas perdendo o carácter interrogativo.
Até que um dia uma estranha doença aniquilou todas as vacas da aldeia, sobrando apenas 3 bois, um bezerro e as galinhas. Os populares a partir desse dia, e tal era o trauma, não conseguiam proferir a palavra “vaca”, porque se o fizessem desatavam num pranto, recordando com saudade as suas mimosas que tanto leite lhes tinha dado. Perante esta impossibilidade, e uma vez que todas as galinhas estavam de perfeita saúde, o dito popular passou a referir os galináceos em vez das vacas. E assim chegou aos nossos dias.
Casa roubada, trancas na porta
Maria Odete foi emigrante em França. Ao fim de 23 anos viu-se forçada a regressar a Portugal. Tudo porque um dia, quando terminado o turno como empregada de limpeza, foi atacada num beco escuro por um pastor alemão. Maria, mulher de fartas nádega, foi seriamente mordida no traseiro, o que lhe desfigurou o “bum-bum” e alterou a forma de andar. Depois de recuperada, decidiu voltar à terra onde nasceu. O seu andar ligeiramente coxo e a desfiguração “nadegal”, visível mesmo sob a roupa, valeu-lhe a alcunha de “Tranca Torta”.Como grande parte dos emigrantes, construiu na sua vila uma enorme vivenda, carregada de mau gosto. Se foi bastante o dinheiro gasto na construção, nenhum foi empregue em medidas de segurança. Nem sequer tinha um cãozito a proteger a casa, algo que se compreende pela sua má experiência com os canídeos.Assim, e como a Maria “Tranca Torta” não aprendia com os erros, a sua casa era assaltada com uma regularidade anual. Nos cafés da vila, por altura do acontecimento que era o assalto, ouvia-se sempre a mesma frase: «Uma casa foi roubada. A da Tranca Torta». Daí derivou para o conhecido ditado.
Só se lembram de Santa Bárbara quando troveja
Os abades do mosteiro de Santa Bárbara tinham realizado votos de silêncio, com uma excepção: só podiam emitir as palavras da divindidade que dava nome à sua ordem, ou seja, «Santa Bárbara». Outra particularidade era o facto da sua dieta ser bastante simples, constituída apenas por feijão com arroz ao pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar. Tal facto aumentava os índices de flatulência a níveis irrespiráveis. Com tal dieta, a tarde era "perfumada" com uma sucessão de traques por toda a abadia. A isto juntavam-se os gritos de «Santa Bárbara», como que dizendo «Irmão Albertino, que cheiro é esse que emanas do teu corpo? Irra! Parece que o Demo morreu dentro de ti».
Na localidade próxima de Santa Teresinha de Baixo, os habitantes já se tinham habituado aos barulhos que surgiam sempre a seguir ao almoço. Além de escutarem os gritos de «Santa Bárbara», ouviam o "ribombar dos tambores" do que eles julgavam ser uma trovoada. Até que um habitante proferiu as sábias palavras de «aqueles só se lembram de Santa Bárbara, quando troveja». Vem daí o provérbio.
Em casa de ferreiro, espeto de pau
O Zé Ferreira tinha uma tasca em Cucujães de Cima, mas isso era só fachada. Na realidade, o estabelecimente escondia o bordel mais conhecido da zona. Quando os "clientes" encontravam na rua uma "empregada" diziam-lhe sempre «em casa do Ferreira, espeto-te o pau». Daí, chegou aos nossos dias como «em casa de ferreiro, espeto de pau».